sexta-feira, 18 de fevereiro de 2011

Canção

Silfos ou gnomos tocam?...
Roçam nos pinheirais
Sombras e bafos leves
De ritmos musicais.

Ondulam como em voltas
De estradas não sei onde
Ou como alguém que entre árvores
Ora se mostra ou esconde.

Forma longínqua e incerta
Do que eu nunca terei...
Mal oiço,e quase choro.
Por que choro não sei.

Tão tênue melodia
Que mal sei se ela existe
Ou se é só o crepúsuclo,
Os pinhais e eu estar triste.

Mas cessa,como uma brisa
Esquece a forma aos seus ais;
E agora não há mais música
Do que a dos pinheirais.

Chove?Nenhuma chuva cai...
Então onde é que eu sinto um dia
Em que o ruído da chuva atrai
A minha inútil agonia?

Onde é que chove,que eu o ouço?
Onde é que é triste,ó claro céu?
Eu quero sorri-te,e não posso,
Ó céu azul,chamar-te meu...

E o escuro ruído da chuva
É constante em meu pensamento.
Meu ser é a invisível curva
Traçada pelo som do vento...

E eis que ante o sol e o azul do dia,
Como se hora me estorvasse,
Eu sofro...E a luz e a sua alegria
Cai aos meus pés como um disfarce.

Ah,na minha alma sempre chove.
Há sempre escuro dentro de mim.
Se escuto,alguém dentro de mim ouve
A chuva,como voz de um fim...

Quando é que eu serei da tua cor,
Do teu plácido e azul encanto,
Ó claro dia exterior,
Ó céu mais útil que o meu pranto?

(Fernando Pessoa)

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